quinta-feira, 28 de julho de 2011

EXTRA! Alex Rocha condenado por improbidade administrativa

O prefeito de São Cristóvão, Alex Rocha (PDT) foi condenado por Impobridade Administrativa.

A decisão é do juiz de Direito Substituto Antônio Cerqueira de Albuquerque.

Eis a decisão:

PODER JUDICIÁRIO

JUÍZO DE DIREITO DA VARA CÍVEL DA COMARCA DE SÃO CRISTÓVÃO

Largo Engº Joel Fontes Costa, s/n, Alto do Cristo, São Cristóvão-Se.

Srs. Advogados: Processo sem movimento há mais de trinta(30) dias, sem motivo justo, informe:

manoelcostaneto@tjse.jus.br

SENTENÇA


Processo nº : 201083000945

Autor : Ministério Público do Estado de Sergipe

Réu: Alexsander Oliveira de Andrade

“O que mais preocupa não é o grito dos violentos, nem dos corruptos, nem dos desonestos, nem dos sem caráter, nem dos sem ética. O que mais preocupa é o silêncio dos bons.”

Martin Luther King


Vistos et coetera.

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SERGIPE, por seu Promotor de Justiça, propôs AÇÃO CIVIL PÚBLICA em face de ALEXSANDER OLIVEIRA DE ANDARADE, alhures qualificado, por acusação de prática de Ato Administrativo considerado como de Improbidade, afirmando que instaurou Inquérito Civil visando apurar suposta apropriação indébita de valores descontados em folha de pagamento dos servidores públicos municipais, em decorrência de empréstimos consignados e não repassados a instituição credora. Relatou a existência de convênio entre a Caixa Econômica Federal e o Município de São Cristóvão, objetivando a concessão de empréstimos aos servidores, com pagamento mediante consignação em folha, porém, apesar de ter havido o desconto em folha, das parcelas devidas, o réu não repassou os valores, gerando o inadimplemento e consequentemente negativação creditícia dos servidores. Ressaltou, que o réu, por ser o administrador, tinha o dever de proceder com os descontos relativos aos empréstimos e igualmente repassar a instituição credora, o que não teria sido feito, dando destinação diversa ao dinheiro arrecadado. Assim, requereu o julgamento procedente com a condenação do réu nas sanções previstas no art. 12, inciso III, da Lei de Improbidade Administrativa. Juntou documentos fls. 09 a 39.

Notificado fls. 40, o réu apresentou defesa prévia, fls. 46/60, alegando que ao tomar posse em 2009, já teria encontrado um débito junto a instituição financeira correspondente a 04(quatro) meses de repasse, correspondente a setembro, outubro, novembro e dezembro. Afirmou, que em janeiro de 2009, retomou os repasses, mas que o débito ao invés de diminuir, aumentava, já que a instituição descontava os crédito do valor global da dívida. Tentou efetuar um acordo com a instituição credora, sem obter exito. Ressaltou a inexistência de ato tido como de improbidade, por ausência de desonestidade. Tentativa de resguardar o interesse do município. Inadequação tipica da conduta, pois nem toda conduta violadora dos princípios da administração pública se amolda à improbidade administrativa prevista no caput, do art. 11, devendo o ator ser também desonesto. Requereu o arquivamento do libelo.

Às fls. 68, foi recebida e determinado o processamento da ação de improbidade administrativa e citação do réu.

Citado fls. 63, o réu, apresentou contestação fls. 65/79, alegando, preliminarmente a Impossibilidade do agente político responder pela Lei 8.429/92, em razão de especialidade dos crimes de responsabilidade; necessidade de litisconsórcio passivo necessário com o ex-gestor Jadiel Campos. No mérito sustentou que ao tomar posse como prefeito encontrou débito junto a instituição credora correspondente a 04(quatro) meses. Ao iniciar o mandato, retomou os repasses, contudo, a Caixa Econômica, não descontava os valores correspondentes aos meses recebidos, mas sim do valor global do débito, acarretando prejuízo a municipalidade. Afirmou que tentou celebrar acordo, mas não obteve sucesso, levando-o a ajuizar ação na Justiça Federal para imputar pagamento do respectivo mês de desconto. Ressaltou a inexistência de ato improbidade, afirmando que não houve desonestidade; tentativa de resguardar o erário; não houve apropriação dos valores. Inexistência de elemento subjetivo, por não ter agido desonestamente. Não violação aos princípios da administração púbica, ausência de adequação típica. Ressaltou que nem toda conduta violadora dos princípios da administração pública se amolda à improbidade administrativa prevista no caput, do art. 11, pois a conduta deve ser também desonesta. Pugnou pelo acatamento das alegações e fosse o ex-gestor Jadiel Campos chamado a responder como litisconsorte passivo necessário. No mérito requereu o julgamento improcedente do pedido.

Às fls. 81/90, o MPE afirmou a aplicabilidade da LIA 8.429/92, por natureza jurídica diversa, da previsão dos crimes de responsabilidade. Desnecessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário com o ex-gestor, por não haver obrigatoriedade legal, bem como não ser uma relação jurídica indivisível. Inexistência de prejuízo no repasse, tendo em vista que os recursos não se tratam de receita municipal, mas sim de desconto da remuneração dos servidores, além de ocasionar prejuízo maior pela incidência de juros, multas e correções. No mérito sustentou a prática de atos de improbidade administrativa e requereu a condenação.

Eis o breve relato. DECIDO.

Trata-se de Ação Civil Pública que tem por objeto a apuração de atos considerados como de Improbidade Administrativa, ajuizada pelo MPE visando a condenação do réu Alexsander Oliveira de Andrade, por acusação de ter se apropriado e não repassado verbas oriundas de descontos nos pagamentos de servidores, sob o pretexto de repasse a instituição credora, por conta de convênio para empréstimo consignado.

Evidenciada a legitimidade do parquet estadual para a propositura desta demanda, no exercício de suas nobilíssimas atividades, já que o art. 129, III, da Constituição Federal disciplina, como uma das funções institucionais do Ministério Público, promover a Ação Civil Pública, visando a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente, e de outros interesses difusos e coletivos.

Vislumbro a desnecessidade de instrução do feito, visto que a matéria agitada é de fácil apreciação, embora composta por elementos de fato e de direito. Os aspectos fáticos iniciam-se pelo exame da documentação acostada em sua fase regular, não havendo necessidade de produção de prova oral em audiência, ensejando a possibilidade de julgamento antecipado da lide, encaixando o pedido autoral no inciso I do art. 330 do Diploma Processual Civil.

Após a fase postulatória, o Juiz deve observar detidamente a questão. Sentindo-se suficientemente convencido dos fatos expostos pelas partes e observando não carecerem de produção de provas, deverá antecipar o julgamento da demanda. Da mesma forma agirá quando as provas documentais anexadas aos autos pelo autor o levarem ao exaurimento da cognição acerca dos fatos expostos.

Não há o que se falar em cerceamento defesa, caso se tenha certeza da prescindibilidade da audiência instrutória, estando o Magistrado suficientemente convencido para prolatar sentença, espalhando seu juízo de certeza.

Também não é preciso que o Juiz ANUNCIE às partes que irá julgar, para que não represente ato de surpresa e cerceamento de defesa. Ora, quem não só anuncia às partes, mas prevê explicitamente é a Lei Processual, não havendo surpresa alguma para os envolvidos, caso o Juiz opte pelo conhecimento antecipado da lide.

A Jurisprudência é assente:

“(…)1. O julgamento antecipado da lide (art. 330, I, CPC), não implica cerceamento de defesa, se desnecessária a instrução probatória. (Precedentes). 2. O art. 131, do CPC consagra o princípio da persuasão racional, valendo-se o magistrado do seu livre convencimento, que utiliza-se dos fatos, provas, jurisprudência, aspectos pertinentes ao tema e da legislação que entender aplicável ao caso concreto, rejeitando diligências que delongam o julgamento desnecessariamente. Trata-se de remédio processual que conspira a favor do princípio da celeridade do processo.(…)”(AgRg no REsp 417830 / DF; AGREsp 2002/0019750-3 Ministro LUIZ FUX T1 – PRIMEIRA TURMA DJ 17.02.2003 p. 228)

Nesse sentido:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - ANÁLISE DA LEGALIDADE DAS CONTAS PÚBLICAS PELO JUDICIÁRIO - POSSIBILIDADE - LEGITIMIDADE "AD CAUSAM" DO MINISTÉRIO PÚBLICO - CERCEAMENTO DE DEFESA - JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE - INOCORRÊNCIA - RESSARCIMENTO AO ERÁRIO - RECURSO DESPROVIDO. 1. O Ministério Público é parte legítima para ajuizar ação civil pública por improbidade administrativa. 2. Não há cerceamento de defesa em julgamento antecipado da lide quando no processo encontram-se presentes todas as provas necessárias ao convencimento do magistrado. 3. (...). 4. Os atos de improbidade administrativa são puníveis com o ressarcimento ao Erário Público, nos termos da Lei nº 8.429/92 e do art. 37, § 4º, da CF/88. 5. Recurso Desprovido. (TJMG, AC nº 000.315.618-9/00, Comarca de São João Nepomuceno, Relator: Pedro Henriques, Julg. Em: 28/04/2003).

"PROCESSO CIVIL - DESNECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVAS - INDEFERIMENTO DE PEDIDO DE REALIZAÇÃO DE PROVA PERICIAL E TESTEMUNHAL - CERCEAMENTO DE DEFESA - INOCORRÊNCIA - Cabe ao juiz, de ofício ou a requerimento das partes, indeferir as diligências inúteis ou meramente protelatórias, decisão essa que não viola o princípio constitucional da ampla defesa e do contraditório, se a questão de mérito é unicamente de direito, ou, sendo de direito e de fato, não houver necessidade de produção de provas, tendo em vista os documentos já carreados para os autos." (TJMG - Agravo nº 000.166.042- 2/00 - Comarca de Belo Horizonte Relator Des. José Antonino Baía Borges - Pub. 07/04/2000).

Desta feita, afasta-se a argüição de cerceamento de defesa.”

(Apelação nº 7872/2009. De. Rel . José Alves Neto)

Apenas para impedir eventuais motivações recursais, quanto à prescindibilidade de audiência instrutória, esclareço que a prova em juízo deve se prender a fatos Pertinentes, Necessários e Relevantes à formação da convicção do Juiz. A análise daquilo que seja “ponto controvertido” a ser demonstrado quando da audiência de instrução de julgamento passa pela existência de “fato” que seja “dependente de prova oral”. Não se pode conceber que haja fato controverso quando este se faz dissipar por prova documental ou pericial. A audiência instrutória, apesar de ser corolário do Principio do Contraditório e da Ampla Defesa, não deve ser utilizada como instrumento de postergação de feitos ou satisfação pessoal da parte de ser ouvida pelo Juiz. Tal ato deve ser utilizado apenas para a colheita de prova oral imprescindível ao julgamento.

Os pontos dependentes de prova oral também não podem advir de avaliações subjetivas. O Testemunho compromissado ou descompromissado se prende a FATOS, e não a roupagem jurídica do fato.

O CPC informa com excepcionalidade que, QUANDO O FATO JÁ ESTIVER PROVADO POR DOCUMENTO OU POR CONFISSÃO, não se admitirá a prova Oral. Realmente, se o documento é autêntico e não houve impugnação quanto à sua veracidade, haverá dispensa da prova oral, pois ele é suficiente para fornecer os dados esclarecedores do litígio.

Assim, resta claro que, sendo o Juiz o destinatário da prova, é ele quem deve aferir a necessidade da audiência, evitando as diligenciais inúteis e protelatórias.

Para corroborar estas alegações, recorro ao jurista Sálvio de Figueiredo Teixeira, citado por Joel Dias Figueira Jr.: “(...)quando adequado, o julgamento antecipado não é faculdade, mas dever que a lei impõe ao julgador.” E mais: “Desde que a hipótese em concreto se enquadre nos moldes dos incisos I e II do art. 330, o julgamento se faz mister sem que se verifique qualquer tipo de cerceamento. Trata-se, portanto, de dever do juiz e não de faculdade ou simples liberalidade.”

O MPE afirmou que o réu, não efetuou repasse de dinheiro descontados do pagamento dos servidores, sob a natureza jurídica de empréstimo consignado.

Em contra partida o réu, alegou preliminarmente impossibilidade do agente publico responder pela LIA 8429/92, pela natureza da especialidade dos crime de responsabilidade; ausência de elemento subjetivo; necessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário com o ex-gestor Jadiel Campos. No mérito alegou ausência de ato improbo; interesse de preservação dos recursos públicos e ausência de dolo.

É antiga a máxima de origem romana do: dê-me os fatos que te darei o Direito. Isto é a base do Princípio da Substanciação, empregado de forma mitigada no sistema processual vigorante. Concorre também aqui a aplicação do Princípio Jurisdicional do jura novit curia. Diante dos fatos narrados de forma clara e objetiva, o Magistrado, conhecendo previamente o direito, os admite como deflagrador da atividade jurisdicional.

A causa de pedir ou causa petendi são os fatos que fundamentam a pretensão manifestada pelo demandante. Adotando o Princípio da Substanciação, a causa de pedir é um conjunto de fatos, ou seja, é o suporte fático da pretensão manifestada pelo demandante em juízo, que encontra encaixamento na ordem jurídica vigorante, adquirindo a necessária tipicidade. Divide-se a causa de pedir em remota e próxima. A causa remota é o fato constitutivo do direito afirmado em juízo, e a próxima é o fundamento jurídico, gerador do interesse de agir. Observe que o fundamento jurídico não se confunde com a roupagem jurídico-legal, muito menos com o dispositivo legal conferida pelo autor: “Não integra a causae petendi a qualificação jurídica que o confere ao fato em que baseia sua pretensão. Assim, se o autor promove uma ação visando à anulação de uma escritura, alegando erro e não obtêm êxito, não pode, posteriormente, propor a mesma ação com base nos mesmos fatos, sob a invocação de que o que houve foi dolo”#. Não é outro o entendimento, justamente pelo fato de que, a ausência de fundamento jurídico, desnatura a existência do fato constitutivo.

No presente caso o MPE, através de roupagem jurídica, imputou ao réu a pratica de atos em dissonância com a lei de improbidade administrativa. Há causa de pedir explícita e clara, sendo a demanda apta formal, preenchido, assim, o Pressuposto Processual de Validade.

Foi concluída a concorrência de elementos fáticos que respaldaram o pedido exordial, não havendo eiva no libelo, tanto que recepcionado sem reservas.

O réu traz a ideia de que agente político não responde pela Lei de Improbidade administrativa, mas sim sobre os crimes de responsabilidade.

Outrora havia o entendimento equivocado de que o Chefe do Executivo Municipal não estava sujeito a Ação Civil Pública. Com o desenvolvimento do Direito e o abandono do pragmatismo, passamos a analisar mais o conteúdo ideológico das leis e da sociedade do que propriamente o dizer vocabular.

Agente público é gênero enquanto que agente político é espécie. Tanto que, na conceituação, a lei traz na definição “praticados por qualquer agente público, servidor ou não...”; e reputa agente público, para os efeitos da lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior. Quem, em nosso regime jurídico poderia ocupar TRANSITORIAMENTE, através de ELEIÇÃO, por MANDATO, cargo público? Está cristalino que a Lei 8.429/92 previu a responsabilidade do Agente Político, sendo despicienda a exaustiva descrição daqueles que estão sujeitos à punição estatal. A nomenclatura Agente Político não passa de roupagem jurídica específica para a condição de determinada Autoridade pública.

Agentes Públicos, para o enquadramento da Lei de Improbidade Administrativa, podem ser: Agentes políticos; Agentes autônomos; Servidores públicos; Magistrados; Particulares em colaboração com o Poder Público.

Não é outro o entendimento esposado pelos Tribunais pátrios:

Constitucional e Administrativo - Ação Civil Pública - Aplicabilidade da Lei nº 8.429/1992 - Agentes políticos - Possibilidade - Ato de improbidade administrativa - Ausência - Respeito ao princípio da publicidade - Requisição de informações ao Prefeito Municipal - Vereadores, em nome próprio - Impossibilidade - Competência da Câmara Municipal.

I - A lei nº 8.429/1992 é aplicável aos agentes políticos, em virtude de expressa previsão legal e em consonância com o mais recente entendimento do Supremo Tribunal Federal e precedentes do STJ;

II - (...);

III - (...);

IV - (...);

V - Recurso conhecido e desprovido.

(APELAÇÃO CÍVEL Nº 3823/2008, BARRA DOS COQUEIROS, Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, Relator: DESA. MARILZA MAYNARD SALGADO DE CARVALHO, Julgado em 04/08/2009).

E mais:

EMENTA: RECLAMAÇÃO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - AGENTE POLÍTICO - LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - SUJEIÇÃO - NATUREZA CÍVEL. O agente político, espécie do gênero agente público, sujeita-se tanto às sanções penais (crimes de responsabilidade) como àquelas previstas na Lei de Improbidade Administrativa, que tem natureza cível, quando sua conduta se enquadra nas hipóteses descritas nas respectivas legislações. (Apelação Cível nº1.0000.08.476867-0/000. Des. Rel. Alvimar de Ávila. 20.03.2009

Superior Tribunal de Justiça

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. EX-PREFEITO. COMPETÊNCIA. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 7/STJ.

I - Ex-prefeito não se enquadra dentre aquelas autoridades que estão submetidas à Lei nº 1.070/1950, que dispõe sobre os crimes de responsabilidade, podendo responder por seus atos na via da ação civil pública de improbidade administrativa.(REsp. 764.836 – SP. Min. Rel. Francisco Falcão. 19.02.2008).

ADMINISTRATIVO - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - PROMOÇÃO PESSOAL - PROPAGANDA COM CARÁTER NÃO - EDUCATIVO - EX-PREFEITO - SUJEIÇÃO À LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.

O ex-prefeito submete-se ao rito das ações de improbidade administrativa. Esses agentes, porque destituídos de seu munus, não se acham enquadrados nos termos da Lei n. 1.070/1950, que dispõe sobre os crimes de responsabilidade. Sua participação no processo de improbidade é legítima. Precedente: (REsp 764.836/SP, Relator Ministro José Delgado, Relator p/ acórdão Ministro Francisco Falcão, DJ 10.3.2008). Agravo regimental improvido.

É por todos os motivos é que sigo as brilhantes lições do eminente jurista Erich Danz, que afirmou: “A vida não está ao serviço dos conceitos, mas sim estes ao serviço da vida. É preciso atender, não ao que ordena a lógica, mas sim, ao que exige a vida, a sociedade, o sentimento jurídico, tanto quanto seja necessário.” Assim, resta claro que inconstitucionalidade alguma, seja material ou formal, existe a macular a Lei 8.429/92, Lei de Improbidade Administrativa.

Apesar de informar a especialidade da Lei de Crimes de Responsabilidade, deve-se observar que a Lei de Improbidade Administrativa apresenta natureza jurídica administrativa/cível, enquanto que a Lei de Crimes de Responsabilidade tem natureza jurídica criminal, ainda que não cominada pena restritiva de liberdade. Tamanha confusão advém da suposta ideia de que o processo cível seria utilizado para apurar responsabilização criminal. Ora, a apuração criminal, é feita através da aferição de crime de responsabilidade, que prevê sentença condenatória restritiva de liberdade, ou seja, a primeira lida com conteúdos materiais e a segunda, com direitos individuais e indisponíveis. Outrossim, é despiciendo esclarecer que os parágrafos do artigo 84 do CPP, foram alvo de da ADIN 2797-2 e, portanto, não mais vigoram.

Rejeito as preliminares.

Litisconsórcio, nada mais é do que o “consórcio de litigantes”. Pode ser ativo – quando formado por autores; ou passivo – formado por réus, gerando a pluralidade de partes.

Misael Montenegro, esclarece que “O fato de contornos jurídicos que dá ensejo à formação do processo pode encontrar-se ligado a mais de um titular, o que justifica o exercício do direito por mais de um autor e/ou em face de mais de um réu. O litisconsórcio impõe a cumulação subjetiva da relação jurídico-processual, justificando-se por razões de economia processual e do afastamento da possibilidade de serem lançadas decisões em processos que se ramifiquem de um mesmo tronco em comum”.

Invoco, ainda, do mesmo entendimento que o mestre Carnelutti: “Ciertamente, una de las razones de este favor es económica y consiste en el ahorro, que se puede obtener, de tiempo e de medios; pero ésta no es la única razón ni las más grave. Otra razón se refiere al peligro de decisiones contradictorias que podría verificarse se los procesos se separasen, puesto que el elemento común podria ser apreciado diversamente” (CARNELUTTI, Francesco. Derecho y proceso. Buenos Aires: Europa-América, 1971, p. 114).

O litisconsórcio quanto à “obrigatoriedade de sua formação”, divide-se em facultativo e necessário. O litisconsórcio necessário deriva da lei ou da “natureza da relação jurídica”, sendo esta última figura construída em cima de conceito jurídico impreciso, mas que é doutrinariamente entendida como sendo destinada àqueles terceiros com interesse jurídico direto ou indireto, e que se beneficiarão ou serão prejudicados pelos efeitos da sentença meritória.

In casu, lei alguma existe a impor, na relação jurídico-processual, a inserção de Jadiel Campos no polo passivo. Mesmo levando-se em conta a informação de que ele também não teria efetuado os repasses, não há a menor relação com os limites subjetivos desta lide. Nesta demanda o que se pede é a condenação do réu Alexsander Oliveira Andrade, por não ter efetuado repasse na sua gestão. Quanto a repasses anteriores sob administração de terceiro os limites subjetivos da coisa julgada não a atingirão, devendo a responsabilidade daqueles atos recair sobre o gestor anterior. Fato é que, o ato omissivo anterior não excepciona o ato omissivo posterior.

Assim, é perfeitamente possível, aliás recomendável, que a responsabilidade do ex-gestor venha a ser apurada em processo autônomo. A conduta do Sr. Jadiel Campos não se confunde com a do réu, posto que não sofrerá os mínimos efeitos decorrentes da futura coisa julgada, de molde a apenas trazer mais um elemento à relação processual, tumultuando-a.

Logo, rejeito o litisconsórcio passivo pugnado pelo demandado.

No mérito, constato que o réu é confesso quanto ao fatos afirmado pelo MPE, consistentes em não repasse da verba retida a título de empréstimo consignado. Em nenhum momento o réu contestou os fatos, apenas atribuiu-lhe fundamentos diferentes do informado pelo MPE.

É do conhecimento de todos que, o Município de São Cristóvão celebrou convênio com a Caixa Econômica Federal, para possibilitar a contratação de empréstimos consignados, ficando o município, através do seu gestor, obrigado a efetuar os descontos em folha de pagamento e repassá-los imediatamente a instituição credora.

Apesar da vigência do convênio, o réu, então prefeito municipal, achou por bem não efetuar os repasses dos valores descontados, sob o fundamento de que a Caixa Econômica estava efetuando os desconto sobre a divida global deixada por gestor anterior e não sobre o efetivamente descontado dos pagamentos dos servidores, ensejando assim, prejuízo ao Município de São Cristóvão.

Assim, voluntariamente o réu deixou de efetuar o repasse, sem a menor legitimidade, isto porque o valor retido dos servidores não tem natureza jurídica de receita. O produto retido é de propriedade da Caixa Econômica Federal e não do Município, motivo pelo qual qualquer retenção pelo gestor seja a que título for é ilegal e abusiva. Como bem asseverou o MPE: “o município é apenas o elo de ligação”.

Ao contrario do que afirma, prejuízo ocorre é com a suspensão dos repasses, tendo em vista que continuaram a incidir juros, multa e demais acessórios. É preciso que se esclareça que a retenção ilegal daquele dinheiro não suspendeu os efeitos da mora. Se o réu não concordava com a forma de desconto tinha inúmeros instrumentos jurídicos para solução da problemática, mas com certeza a suspensão unilateral do repasse não era um deles.

Também não se diga que buscou o Poder Judiciário, eis que a ação processo tombado sob nº0005115-85.2010.4.05.8500 tramitante Justiça Federal foi ajuizada tardiamente, só ocorrendo muito tempo depois da suspensão dos repasses e inclusive posteriormente ao ajuizamento desta demanda de improbidade.

De mais a mais, é importante consignar que os efeitos da sentença nos autos em tramite na Justiça Federal reconheceria apenas a ilegalidade na imputação ao pagamento, feito pela Caixa Econômica Federal, aproveitando todos os repasses, que deveriam ter sido regularmente efetivados.

Por outro lado nem a sentença, muito menos o simples ajuizamento de demanda, tem o condão legalizar a retenção daquele dinheiro. Sobretudo porque aquela ação já foi julgada improcedente e em contrapartida a demanda reconvencional proposta pela Caixa Econômica Federal foi julgada procedente nos seguinte termos:

“1. DISPOSITIVO.

3.1 Da ação ordinária:

Ante todo o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido inicial da parte autora.

Sem custas.

Condeno a parte autora em honorários advocatícios, os quais arbitro em 5% (cinco por cento) sobre o valor atualizado atribuído à causa, com base nos parâmetros contidos no art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC.

P.R.I.

3.2 Da reconvenção:

Ante todo o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido reconvencional para determinar que o Município de São Cristóvão deposite em conta judicial, à disposição desta 2ª Vara Federal, junto ao PAB localizado na sede deste Fórum, o valor retido das folhas salariais do funcionalismo municipal referentes aos empréstimos consignados e não repassados para a credora (CEF), até o montante de R$ 2.639.337,69 (dois milhões, seiscentos e trinta e nove mil, trezentos e trinta e sete reais e sessenta e nove centavos), atualizado nesse valor até a data reportada no documento de fl. 255 destes autos.

Condeno a parte reconvinda em custas processuais e em honorários advocatícios, os quais arbitro em 5% (cinco por cento) sobre o montante acima consignado, valor este a ser devidamente atualizado, também com base nos parâmetros contidos no art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC.

P.R.I.”

Apesar dos efeitos da decisão não vincularem este Juízo, como já foi afirmado o ato imputado improbo diz respeito ao não repasse de retenção de valores a título de empréstimo consignado, o que repito, não foi contestado. Assim, não prevalecem os supostos motivos fundados no ajuizamento da ação perante a Justiça Federal, eis que julgados completamente improcedentes.

É importante destacar que o Município de São Cristóvão descontou a verba dos servidores, não repassou e agora não possui o dinheiro em caixa para cumprir a obrigação a qual foi condenado.

Outrossim, este Juízo, em demanda similar aquela finda na Justiça Federal, se manifestou pela obrigatoriedade do Município efetuar o repasse dos valores retidos por consta de empréstimos consignados. Vejamos trecho da sentença exarada no processo nº200983001043:

“A indagação lógica e plausível é de que, se tal valor saiu dos cofres públicos, qual o destino?

Diante desta mesmíssima ocorrência, o Prefeito do Município de Monte Alegre de Sergipe foi recentemente afastado do cargo por liminar, ante a propositura de Ação Civil Público pelo MPE, por entender tratar-se de ato de improbidade administrativa.

Assim, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial e CONDENO o MUNICIPIO DE SÃO CRISTOVÃO à obrigação de fazer consistente em repassar os valores vencidos e os vincendos, mensalmente, à Caixa Econômica Federal, descontados em folhas de pagamento dos servidores públicos a título de empréstimo, sob pena de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por dia de descumprimento, a ser revestida na forma do art. 13 da LACP.

Mantenho em todos os termos a liminar deferida, a fim de assegurar o efetiva prestação jurisdicional. Decorrente da Tutela Antecipada antes conferida para dar Eficácia Imediada, comprove o Município em 15 dias, a quitação do débito vencido até esta data, sob pena de Sequestro nas contas bancárias do Município, sem prejuízo do enquadramento no Crime de Desobediência.

Condeno, ainda, o Município o pagamento das custas processuais.

Na forma do Art. 40 do Código de Processo Penal, determino a extração de cópias destes autos e o encaminhamento à Procuradoria Geral de Justiça, para as providências que entender cabíveis.

P.R.I.”.

O Réu minimizou a gravidade do fato articulado pelo Ministério Publico Estadual ao reportar não ocorrência de ilegalidade por ausência de elemento subjetivo e inexistência de dano ao erário. É preciso ter em mente que não se trata apenas de descumprimento de preceito administrativo. A imputação feita ao Réu é grave, vez que lhe é atribuída a conduta de não repassar indevidamente produto retido de folha salarial, por conta de empréstimo consignado.

Como dito anteriormente, A indagação lógica e plausível é de que, se tal valor saiu dos cofres públicos, qual o destino?

A Lei de Improbidade Administrativa prevê três modalidades de atos ímprobos: a) atos que importem em enriquecimento ilícito (artigo 9º); b) atos que causem prejuízo ao erário (artigo 10); c) atos que atentem contra princípios da administração (artigo 11).

Segundo o art. 9º, a conduta de improbidade gera enriquecimento ilícito quando o autor aufere “qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício do cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1º”, da lei.

Exige-se, nessa hipótese, a percepção de vantagem patrimonial ilícita obtida pelo exercício da função pública em geral, sendo desnecessário o dano ao erário.

Reza o art. 10 que “qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbarateamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º” da mesma lei.

Nesse caso, somente se caracterizará o ato de improbidade se houver dano ao erário. Dispensa-se, portanto, a ocorrência do enriquecimento ilícito.

Diz o art. 11 da Lei 8.429/92 que “Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições”.

Analisando-se detidamente a questão é induvidosa a retenção unilateral do valor descontado dos servidores municipais, que ocasionou inúmeros prejuízos àqueles, ante a negativação creditícia, tendo isto ficado consignado em demanda neste Juízo, autos do processo nº201083000105.

A irregularidade apontada pelo MPE se resume a retenção/apropriação indevida de recursos descontados dos salários dos servidores municipais por conta de empréstimo consignado realizado com a Caixa Econômica Federal.

Em contraposição o réu alega que reteve legitimamente o recurso sob afirmação de que a Caixa fazia imputações ao pagamento indevidas, tendo inclusive ajuizado ação na Justiça Federal, para regularização. Ocorre, como já foi explanado, dita ação foi julgada improcedente, falecendo os argumentos expendidos pelo réu, que arbitrariamente se apropriou daquilo que não lhe pertence. O Município de São Cristóvão era apenas o consignatário do dinheiro recolhido. Não lhe assitia alternativa a não ser efetuar o repasse daquilo que fora recolhida a título de consignação. E o pior, com o julgamento da demanda reconvencional, foi condenado a pagar juros e multa desnecessariamente do dinheiro que já saiu dos cofre públicos e deveria ter sido entregue a instituição credora.

Ainda atinente a irregularidade apresentada pelo MPE, há a alegação formal de inexistência de ato improbo.

Os Princípios alicerçadores da ciência jurídica, base de toda a construção do Direito, já foram tidos como meros instrumentos de interpretação e integração das regras legais. Era a estreiteza da visão positivista que atribuía ao direito posto caráter preponderante em nossa ciência.

Hoje, contudo, vivemos um período pós-positivista, sendo certo que os Princípios deixaram de ser vistos como mero complemento da regras e passaram a ser também considerados normas cogentes (fazendo-se mister a distinção entre normas princípios e normas disposições), impondo-se, sem dúvida, sua estrita observância. Ouso dizer que a tão difundida Norma Hipotética Fundamental de Kelsen, não é a Constituição, mas sim aquilo que deve ser tido como Ordenamento Constitucional que é composto pelos Princípios. "Os princípios, a exemplo das regras, carregam consigo acentuado grau de imperatividade, exigindo a necessária conformação de qualquer conduta aos seus ditames, o que denota o seu caráter normativo (dever ser). Sendo cogente a observância dos princípios, qualquer ato que deles destoe será inválido, conseqüência esta que representa a sanção pra inobservância de um padrão normativo cuja relevância é obrigatória." (Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves, Improbidade Adminitrativa, 2ª ed. 2004, Lumem Juris, p.43).

Muitos são os interesses públicos hábeis a legitimar a atuação administrativa que se pode extrair da Constituição, observando-se da lição de Leonardo José Carneiro da Cunha que “o interesse público identifica-se com a idéia de bem comum e reveste-se de aspectos axiológicos, na medida em que se preocupa com a dignidade do ser humano”.

Não se pode, entretanto, opor completamente a ideia do bem individual à do bem comum sob pena de se comprometer a finalidade deste, conforme destaca Miguel Reale: “Se, como diz Scheler, o bem consiste em servir a um valor positivo sem prejuízo de um valor mais alto, o bem social ideal consistirá em servir ao todo coletivo respeitandose a personalidade de cada um, visto como evidentemente ao todo não se serviria com perfeição se qualquer de seus componentes não fosse servido”

O conceito de interesse público encontra guarida nos valores máximos da Constituição. Por tal motivo, não se opõe ao Estado. Porém com ele não se confunde. O fato é que o Estado se constitui num vetor do interesse público, cujo compromisso maior é voltado à sua realização, enquanto mecanismo necessário para tal. Um verdadeiro interesse público exige a presença de um bem social indisponível transcendental, isto é, acima dos interesses individualizados das partes. Por outro lado, o interesse público não se confunde com interesses meramente privados.

É importante reconhecer, no dizer de Marçal Justen Filho, que o interesse público alcança dimensão essencialmente “ética”, adequada ao pluralismo da sociedade contemporânea, e, simultânea subordinação das ações administrativas à satisfação da dignidade da pessoa humana. Sobressaindo-se dessa análise, a “personalização” do fenômeno jurídico em detrimento da sua “patrimonialização”, no sentido de impor o fiel respeito aos direitos fundamentais.

Nessa linha de raciocínio, cumpre ressaltar que a Constituição Federal, em seu artigo 37, caput, arrola como princípios explícitos que devem ser observados por todos os Poderes da Administração da União, dos Estados e dos Municípios, a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência.

Entre esses, por ser pertinente in casu, cabe tecer considerações sobre o postulado da legalidade, da impessoalidade e da moralidade.

Pelo Princípio da Legalidade a Administração deve observar estritamente as leis, não podendo agir senão quando e conforme permitido pela ordem jurídica.

Celso Antonio Bandeira de Melo afirma que:"Assim, o princípio da legalidade é o da completa submissão da Administração às leis. Esta deve tão-somente obedecê-las, cumpri-las, pô-las em prática. Daí que a atividade de todos os seus agentes, desde o que lhe ocupa a cúspide, isto é, o Presidente da República, até o mais modesto dos servidores, só pode ser a de dóceis, reverentes, obsequiosos cumpridores das disposições gerais fixadas pelo Poder Legislativo, pois esta é a posição que lhes compete no Direito brasileiro. Michel Stassinopoulos, em fórmula sintética e feliz, esclarece que, além de não poder atuar contra legem ou praeter legem, a Administração só pode agir secundum legem. (Curso de Direito Administrativo Brasileiro, 17ª ed. Malheiros, 2004, p.92).

Assim, na prática de seus atos, a Administração jamais pode agir contra a lei, o que sem dúvida lesa o próprio Estado Democrático de Direito.

Por sua vez, o Princípio da Impessoalidade, conforme lecionam à unanimidade as obras de Direito Administrativo, deve ser entendido sob duas perspectivas: num primeiro sentido, a impessoalidade significa que o autor dos atos estatais é o Órgão ou Entidade e não a pessoa do agente (por isso, v.g., é vedada a publicidade da Administração que apresente imagens, nomes e símbolos que caracterizem promoção pessoal de autoridade ou de servidores públicos). Na segunda acepção a impessoalidade exige que o administrador realize os atos de seu mister de acordo com a finalidade pública, e nunca agindo para beneficiar ou afetar determinadas pessoas, pela simples razão de serem essas mesmas pessoas amigas ou desafetas do administrador.

Estes são os lapidares ensinamentos da doutrina especializada:

"Sob outra ótica, torna cogente que a administração dispense igualdade de tratamento a todos aqueles que se encontram em posição similar, o que pressupõe que os atos praticados gerem os mesmos efeitos e atinjam a todos os administrados que estejam em idêntica situação fática ou jurídica, caracterizando a imparcialidade do agente público. (...) Com isto preserva-se o princípio da isonomia entre os administrados e o princípio da finalidade, segundo o qual a atividade estatal deve ter sempre por objetivo a satisfação do interesse público, sendo vedada a atividade discriminatória que busque unicamente a implementação de um interesse particular." (Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves, Improbidade Administrativa, 2ª ed. 2004, Lumem Juris, p.55-56).

E mais:

"...o princípio (da impessoalidade) estaria relacionado com a finalidade pública que deve nortear toda a atividade administrativa. Significa que a Administração não pode atuar com vistas a prejudicar ou beneficiar pessoas determinadas, uma vez que é sempre o interesse público que tem que nortear o seu comportamento..." (Sérgio Monteiro Medeiros, Lei de Improbidade Administrativa, 2003, Ed. Juarez de Oliveira, p.100).

O último Princípio é o da Moralidade, exigida para a validade de qualquer ato da Administração. Na corrente lição de Hauriou, "a moral administrativa não equivale à moral comum, mas deve ser entendida como uma moral jurídica, equivalendo a um conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da Administração. Elucidando o tema, o referido autor ensina que o agente administrativo, como ser humano dotado de capacidade de atuar, deve, necessariamente, distinguir o Bem do Mal, o honesto do desonesto. Não poderá desprezar o elemento ético de sua conduta, pelo que não basta distinguir entre o legal e o ilegal, o justo e o injusto, mas também entre o honesto e o desonesto..."

Neste passo, os atos ímprobos devem ser rechaçados, porque ofendem aos Princípios.

Nessa hipótese, exige-se somente a vulneração dos Princípios Administrativos, sendo dispensável o enriquecimento ilícito e o dano ao erário, ou seja, basta do agente a conduta violadora dos Princípios.

Wallace Paiva Martins Júnior, Ilustre Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo, comentando o dispositivo afirma que:

"O art. 11 é a grande novidade do sistema repressivo da improbidade administrativa, dirigido contra o comportamento omissivo ou comissivo violador dos princípios que regem a Administração Pública e dos deveres impostos aos agentes públicos em geral..."

E anota ainda que:

"A violação de princípio é o mais grave atentado cometido contra a Administração Pública, porque é a completa subversiva maneira frontal de ofender as bases orgânicas do complexo administrativo." (Probidade Administrativa, 2ª ed., 2.002, Saraiva, p. 259/260) .

Além do caput do artigo 11 da Lei de combate à Improbidade Administrativa, que prevê de forma aberta a ilicitude de qualquer ato que atente contra os princípios da Administração, a referida Lei Federal, nos incisos dessa disposição legal, arrola as hipóteses mais comuns em que há essa violação.

Dentre essas hipóteses, reza o inciso I do artigo 11 daquele diploma, que configura improbidade administrativa:

I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto na regra de competência; (grifo colocado)

O supra transcrito texto legal abarca o chamado desvio de finalidade, no qual o agente público afasta-se da necessidade de observância da finalidade pública, indispensável na prática de todo ato administrativo, e busca realizá-lo para satisfazer interesse particular.

Na clássica doutrina de Hely Lopes Meirelles:

"O desvio de finalidade ou de poder verifica-se quando a autoridade, embora atuando nos limites de sua competência, pratica o ato por motivos ou com fins diversos dos objetivados pela lei ou exigidos pelo interesse público. O desvio de finalidade ou de poder é, assim, a violação ideológica da lei, ou por outras palavras, a violação moral da lei, colimando o administrador público fins não queridos pelo legislador, ou utilizando motivos e meios imorais para a prática de um ato administrativo aparentemente legal. Tais desvios ocorrem, p. ex., quando a autoridade pública decreta uma desapropriação alegando utilidade pública, mas visando, na realidade, a satisfazer interesse pessoal próprio ou favorecer algum particular com a subseqüente transferência do bem expropriado... (...) O ato praticado com desvio de finalidade – como todo ato ilícito ou imoral – ou é consumado às escondidas ou se apresenta disfarçado sob o capuz da legalidade e do interesse público. Diante disto, há que ser surpreendido e identificado por indícios e circunstâncias que revelem a distorção do fim legal, substituído habilidosamente por um fim ilegal ou imoral não desejado pelo legislador. A propósito, já decidiu o STF que "Indícios vários e concordantes são prova." (Direito Administrativo Brasileiro, 24ª ed., 1999, Malheiros, p.97)

O desvio de finalidade redunda, pois, em frontal lesão aos Princípios da legalidade, moralidade e impessoalidade, uma vez que o agente público que assim procede, utiliza a máquina administrativa de forma mesquinha; arvora-se na qualidade de senhor do poder do administrativo para fins escusos; e, portanto, subverte a própria ideia de Estado, que foi criado para promover o bem comum e não para satisfazer interesses daqueles que estão à frente de uma administração...

Pela propriedade das palavras, impende a transcrição de mais um ensinamento doutrinário:

"A ilegalidade que aqui se apresenta é aquela que mira subverter o ato administrativo, distorcendo-o do gerenciamento de interesses públicos. Não é apenas o corriqueiro "a lei diz isto, o prefeito fez aquilo", mas a utilização indevida do poder jurídico-político, da lei como seu instrumento eficiente, para desviar a atuação administrativa de sua rota predeterminada. É a substituição do social pelo pessoal, do público pelo privado, do coletivo pelo individual. É a não-administração." (Waldo Fazzio Júnior, Improbidade Administrativa e Crimes de Prefeitos, 3º ed. 2.003, Atlas, p.187)

O Réu não alegou a inexistência do fato, mas afirmou a legalidade. Indubitavelmente, houve a retenção, já reconhecida por este juízo duas vezes nos autos de nº 201083000105 e 20118300167, e nos autos nº0005115-85.2010.4.05.8500, decidido na Justiça Federal.

Estão, portanto, completamente evidenciadas e comprovadas as informações trazidas pelo Ministério Público Estadual.

A Lei Federal nº 8.429/92, regulamentando a Lei Maior, estabeleceu que a punição dos atos de improbidade administrativa deverá ocorrer de acordo com as sanções previstas no artigo 12, o qual prevê que cada modalidade de ato de desonestidade tem espécies e gradação de sanções diferentes. As modalidades são praticamente as mesmas, variando, porém, algumas em função do tempo ou de valores.

O primeiro aspecto a ser levado em consideração quanto à aplicabilidade é o da escala de gravidade, isso porque as sanções do art. 9º são mais severas que as do art. 10, e este, por sua vez, fixa sanções mais severas do que as do art. 11.

Pode ocorrer, que uma só conduta ofenda simultaneamente os arts. 9º, 10 e 11 da Lei de Improbidade. Trata-se de ofensas simultâneas, nesse caso, o aplicador da lei deve se valer do Princípio da Subsunção, em que a conduta e a sanção mais grave absorvem as de menor gravidade. As sanções só deverão ser acumuladas se houver compatibilidade para tanto.

Tratando-se das sanções previstas para violação dos arts. 9, 10 e 11 temos que:

Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas, previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações:

I - na hipótese do art. 9°, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, quando houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos, pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos;

II - na hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;

III - na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.

Assim, em face da expressa e clara disposição de lei, constatada a improbidade administrativa pelo prejuízo ao erário ou por flagrante violação de princípios que regem a Administração Pública, é de rigor a imposição de sanções ao Réu, resguardando-se a legalidade, impessoalidade e moralidade administrativas e os interesses de toda sociedade.

A inobservância das regras de legalidade e moralidade dos atos do gestor da coisa pública, independente do valor nominal do patrimônio agredido ou dilapidado, pois faz gerar na sociedade prejuízo incalculável, por exercer um comando anárquico, criando a presunção do direito de que, qualquer cidadão poderá, também, apropriar-se da coisa comum, porque contribuinte e inspirado no modelo apresentado pelo Réu. Creio então que desejou o legislador com a Lei nº 8.429/92, alcançar o ato do gestor do bem público, independentemente do valor do prejuízo causado ao erário, dada a visão moralizadora desta.

Assim, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial mantendo a liminar deferida e reconheço que o Réu ALEXSANDER OLIVEIRA ANDRADE praticou atos de improbidade administrativa, definidos como tal no art. 11, caput, inciso I e II da Lei 8.429/92, condenando-o as seguintes sanções:

a) ressarcimento integral do causado ao erário municipal decorrente do pagamento de multas, juros e outros encargos correlatos, devidamente apurados em sede de liquidação;

b) suspensão dos direitos políticos por 03(três) anos;

c) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 03(três) anos;

d) pagamento de multa civil de 10 (dez) vezes o valor da remuneração percebida pelo Prefeito do Município de São Cristóvão.

Condeno, ainda, o Réu, no pagamento das custas processuais.

Na forma do Art. 40 do Código de Processo Penal, determino a extração de cópias destes autos e o encaminhamento à Procuradoria Geral de Justiça e à Procuradoria da República deste Estado, para as providências que entender cabíveis.

P.R.I.

São Cristóvão/Se, 27 de julho de 2011.

Dr. Antônio Cerqueira de Albuquerque

Juiz de Direito em Substituição

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